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Bem Vindo!

"Todas as tentativas de tornar as coisas compreensíveis se fazem por meio de teorias, mitologias e mentiras."
(H. Hesse).

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

A Ética no Trabalho

Falar de trabalho cansa. Cansa mais por sabemos que o trabalho sempre foi um termo pejorativo. Não se vai ao trabalho, vamos à luta, a batalha, não se trabalha, rala-se, ou pior, trabalho em termos racistas, “hoje é dia de branco”.
Falar da Ética no trabalho então, Meu Deus! Vivemos ainda o período Industrial. Habitamos firmemente a esse período que cada vez mais, tende a desaparecer no horizonte, nada fictício das novas tecnologias. Mas ainda estamos aboletados em suas franjas.
A Ética do trabalho segue a esse desenho. Nasceu em fábricas, moldou-se no gotejar das exigências trabalhistas das fábricas. Nossa carteira de trabalho a bem pouco tempo, trazia em sua primeira folha, um texto que precozinava o quão bom seria possuir uma assinatura só, apenas a chancela de uma empresa em suas páginas; comparavam-nos, a “abelhas.” Isso, também morreu. A morte do ultrapassado, como as regras de Ética outorgadas de cima para baixo, no chão das fábricas. Desejos patronais, sindicais, vontades esdrúxulas de ditaduras, desejos Estaduais, Federais, Municipais.
E entramos na Nova Era. A era da subjetividade. A ética do trabalho sofre então sua mais grandiosa mutação. A possibilidade de escolher entre produtos infinitamente variados alimenta o desejo, que é muito humano, de se sentir diferente dos outros, em vez de igual. O novo humano quer cada vez mais ser único e inigualável.
Outro aspecto sério é a desestruturação do espaço/tempo. O Tempo é nossa neurose. Possuíamos o tempo certo, o lugar específico. O amor ocorria de noite, as compras à tarde, a diversão em um bairro, e assim por diante. Agora todas as nossas ações podem ser feitas a qualquer momento, hora ou lugar. Chegamos ao ponto de poder fazer sexo pago intercontinental. Usos mentalidades e sentimentos separam-se dos lugares e dos horários.
Como a ética dos novos tempos vai lidar com o “overtime”? Exigência do chefe, dependência psicológica? O trabalho diminui, mas as horas em que ficamos nele aumentam. E os estímulos criativos que só se recebe fora do trabalho? Como ser criativo trabalhando 12 horas por dia?
A nova ética vem lidar com isso. O tempo menor que se gasta no trabalho, a vaga que sobra sendo preenchida por outro que também precisa trabalhar. O segundo emprego que pode advir disso. Pela primeira vez no mundo, mudar a organização do trabalho, pode significar mudar a organização de toda uma existência.
Como ainda estamos presos na era da indústria, mesmo vivendo em plena Cyber cultura, sofre os miasmas do passado. Em sua grande maioria, empresas de serviço mantêm milhões de pessoas num regime de baixo nível das ideias, utilizando só as suas capacidades executivas, fazendo com que se envolvam de tal maneira com a burocracia, que elas acabem perdendo a capacidade de inventar e se tornam robôs. Prejudicando a eficiência e a competividade da empresa que acredita ter uma maior produtividade, quanto maior for o tempo que seus funcionários passarem nos seus escritórios, enquanto a verdadeira eficiência é medida com base em ideias produzidas em capacidade criativa.
Um ambiente criativo consiste na ausência de restrições à criatividade, na presença de uma liderança carismática e num clima de entusiasmo que fecunde as ideias. Enquanto nas organizações baseadas na burocracia, as ideias são sufocadas.
Como se processará essa nova ética, de um mundo lento e não esquemático, levando-se em conta que velocidade tem a ver com a era da Indústria; e que velocidade significa capacidade de conquistar terreno em relação aos outros em amargas disputas de espaço?
Esse o desafio que a nova ética do trabalho deverá enfrentar, pode ser traduzido na frase de Bill Gates: “Aqueles que assimilarem as novas categorias projetarão o futuro para os demais.” Nossas novas necessidades não são mais claras e fortes: são constituídas por um mosaico de pequenas necessidades, porém todas importantes.
A nova ética substituirá a luta de classes? Transformará o ambiente de trabalho em um ringue de honestas disputas, entre conscienciosos colegas de trabalho que não se digladiarão?
Posicionando-se frente a isso, o embate entre pensadores do novo. De um lado Richard Sennet e Domenico de Masi. Os dois estudiosos da época imagética, volátil e cibernética em que estamos aboletados. Só que um preconiza as facilidades, as maravilhas que se avizinham o outro, mostra os vãos morais do trabalho da nova era.
Da Nova Era visualizamos em cores, as profundas mudanças da técnica, do ensino, da arte, do sexo, da sociedade. Abandonamos a muito a visão masculina da era Industrial. O mundo não é mais gerido apenas por homens e suas vontades enlutadas.
No Trabalho, ultrapassamos o ideal Taylorista do bom executivo. Estética, Ética, emoção, moderação, emotividade, são vistos agora como visões e sentimentos preferenciais e necessários para quem trabalha.
Mesmo assim, debatemo-nos ainda com a luta talvez eterna de estabelecer um novo paradigma para o trabalho, uma nova ética do trabalho.
“O Cyberspaço abriga zonas de sombra. A identidade de sua população é improvável, cambiante” diz a escritora Rosika Oliveira, e a verdade também é o do balançar do ideal do livre comércio.
Sabemos que é o comércio o grande alavancador de mudanças. É ele que nos traz e força novidades. A falta de comércio, de bens, de circulação de produtos, de novidades, afeta a sociedade das cidades. Afeta o dinheiro circulante, eclode em problemas sociais.
O termo Globalização como teoria de livre comércio, acabou. Embasbacados, observamos a medidas protecionistas numa guerra mundial visando vencer batalhas de grande porte, onde os mortos e feridos, são contados mais facilmente no terceiro mundo, que também ganhou nova formatação. Relatório da OMC, conclui que o alto desemprego nos países desenvolvidos fortalecerá os que defendem o fechamento dos mercados e o isolamento de produtos e trabalhadores estrangeiros. Países como Índia, Indonésia e China, economias relativamente fechadas, mostram forte ritmo de crescimento, porque administram duramente a velocidade de abertura e as áreas em que farão negócios, numa assimilação a teorias econômicas que se pensava extintas, a das áreas lucrativas sendo energizadas e as outras abandonadas. Imaginem esse espectro de teoria econômica num país de dimensões continentais como o Brasil?
“A população do cyberespaço que se delicia no anonimato, se quer também inimputável, sem lei, sem superego, sem tabu.” Pensam viver a uma revolução, um nome cintilante que serve a qualquer coisa. Gestão revolucionária de pessoas, o produto medicamentoso revolucionário, a nova teoria psicanalista, o novo ensino, tudo hoje em dia tem sabor revolucionário, mas qual o que, continuamos embarcados na mesma era com uma diferença apenas: a palavra revolução.
“As balizas do tempo e de espaço, não vigoram no cyberespaço. O lugar do interlocutor é indefinido, o tempo pode ser inventado, relativizando essas dimensões com que sempre trabalhara o pensamento, na ideia mesma do real”.
Viveremos mudanças permanentes, mas infelizmente, nem sempre prazerosas ou emergentes. O privilégio do tempo é a mudança vertiginosa pela qual passou e continuará passando o trabalhador, os ofícios que nos sustem.
“Ninguém sabe o que está por vir. As empresas no mundo inteiro debruçam-se sobre o enigma. Nada está decidido previamente, como nunca antes, foi. É preciso ter humildade de ouvir que acha quem consome, e agilidade para alterar o que já parece bom. É nesse caldeirão de incertezas que se cristalizará nova ética trabalhista.”
Estamos condenados a mudança permanente. Entre o que Sennet e De Mais pensam, existe ou subexiste, um caldeirão de ações passadas e gestos que devem desencadear um futuro. Futuro ético com toda a certeza.
A grande literatura de ficção científica do começo do século vinte até 1950, não conseguiu imaginar a força que teria a matéria plástica. A imaginação do homem não vislumbrou o poder que continha uma invenção humana.
A ética do trabalho de século 21 está aí. Esperando ser alocada. Será ímpia como a de Sennet, com seus grupos jogando falsamente com informações e pior, relações humanas.,ou profundamente organizacional participativos e influentes como em Di Masi?

O Brasil mantém o bom potencial. Que o futuro nos responda.



sábado, 16 de novembro de 2013

A Volta ao Mundo em Oitenta dias*




Escrito na segunda metade do século dezenove, manipulado como um romance de aventuras, que reveste na verdade a um compêndio, o livro não se insere no estilo em moda no período, o Romantismo – Guarda não a signos, mas listas, um apanhar ligeiro de usos, costumes, algo da cultura popular e fazendo jus à fama, Verne lança um repto há ser galgado por uma arte, na época, ainda por se desenvolver, o Cinema.

Criado por um Francês, admirado pela pujança alcançada por uma Inglaterra em pleno fulgor de sua Revolução Industrial, traz como “herói”, Philleas Fogg, uma corruptela significando, a um filho da velha Albion enevoada, que em 1872, aposta durante um jogo de cartas, que poderia dar a volta ao mundo em 80 dias. Para isso, parte célere com seu novo criado, Jean Passepartout. Pelo Cairo, Índia, Japão, China e Estados Unidos, numa viagem pontilhada por aventuras e reviravoltas, que tem em seus personagens secundários, o moto das peripécias por que passam Fogg e seu bando, acrescidos do oficial Fix e da bela Indiana, há quem se inserirá um final feliz.
Texto aberto e vemos elencados, Institutos Culturais, profissionais, os negócios Supra Nacionais, (gelo dos Estados Unidos, Vinho de Portugal), Companhia das Índias Orientais, mercadores de ópio e anil, Great Indian Railway, um inventário, propaganda nada sediciosa, corolário de maravilhas do espírito humano, perpassadas por esquisitices sociais; personagens históricos e fictícios, figuras simbólicas e ambiguidades de julgamento, um texto sem religiosidade alguma, nada de psicologia, coalhado de paradoxos, como só o ser humano possibilita.

Fogg habita a casa que foi do escritor que inventou o vampirismo, e os contos de terror Ingleses, e tem-se o mistério, é um Esquire! E temos dignidade, dinheiro e dons mercadológicos. O Império onde o sol nunca se põe, espraiara seu domínio, suas estradas de ferro, suas leis e seu ópio, por regiões imensas no globo. Paradoxalmente, sendo uma elegia a Inglaterra, a região mais descrita, percorrida e aventuresca no romance, são os Estados Unidos. Com um mesmo olhar surpreso de um Tocqueville, impressionado com a “mobilidade dos Americanos, a ausência de raízes, o empenho febril e a obsessão pelo dinheiro” Verne apresenta a América e suas armas, índios Pawnies, Sioux, equilibra tudo com uma arenga contra os Mórmons e suas crenças, enquanto ajuda a criar a mística do Far West, influenciado talvez pela excursão que Buffalo Bill faz a Europa com seu circo. Descreve cinematograficamente uma luta contra os Sioux, soldados do exército, um rapto, busca e tiroteios, que o cinema desenvolverá em 1902, na mesma América dourada.

A vitória Americana na regata de 1851, na Inglaterra, com certeza colaborou para a visão de “arrojo dos simplórios Americanos”, como citado, enquanto navega, e a fortuita citação a Branshaw, criador de prolífica e popular série de mapas ferroviários e de navegação interior, com seus respectivos horários, Verne segue sua ode a pujança Inglesa e Européia de suas linhas férreas (págs.174, 175,176 e 177) demonstrando a sede de progresso do período, enquanto enumera as Americanas, maiores e então, em rapidíssimo desenvolvimento
Parecendo mesmo propaganda, as armas, que Fogg utiliza na América, são Enfield, Inglesas, (pág. 169), carabinas de ferrolho, e não as pistolas afamadas de tambor, americanas; enquanto acompanhamos as mudanças técnicas e tecnológicas que ocorriam no período.
As mudanças das velas pelo carvão nas embarcações, a velocidade sendo por vezes, outra personagem, tantas vezes surge em citações, os novos designs das embarcações, os vagões de trem especiais, desde 1825 com passageiros, o aço e sua nova composição, mais duro e durável, novas caldeiras para conter e expulsar a todo esse vapor, a imprensa, que ele cita como itinerante, com sensível surpresa e que traduz a muitos dos diferenciais dos dois Continentes; também o que veria a ser o paradigma Americano, os emigrantes e a terra da Promissão, ainda não como a terra da Liberdade, mas a da corrida do ouro Californiano e sua derrubada das Fronteiras do Oeste. Mesmo confundindo nomes como: Los Angeles, tratada por Los Santos, mesmo lá pelas tantas, dizendo que os Americanos “não estão à altura de suas instituições, ou não pesquisando muito bem o trabalho policial, em alta no período, tanto na França como na Inglaterra fazendo de Fix, policial Metropolitano, e não da Scotland Yard, mesmo assim, após variadas peripécias, Fogg e seu grupo, cumprem a jornada, não sem a esperteza e presteza  do criado. O Inglês ganha a aposta, a amizade, a admiração de todos, 20. 000 libras e o amor.  THE END.

A Volta..., é o cartão de visitas ao período, com as poderosas Inglaterra, França  e um EUA, em seu exato momento de prosperar.
O retorno pela Terra Nova atesta o uso, já corriqueiro, das correntes marítimas no período, já domesticadas, conhecidas e mapeadas, e seria interessante averiguar se a “equipagem contrabandista” refere-se a escravistas, na época, sofrendo com a perseguição marítima levada a cabo pelos ingleses, o que poderia explicar as negativas seguidas de Speedy (veloz), que depois é preso ao camarote, o que em condições normais seria considerado como motim, na época, crime passível de enforcamento. Interessante também citar as artes do circo como arte Japonesa, e nos remeter a primeiros malabaristas e contorcionistas a surpreender a Europa, maravilhada com tribos, etnias e sociedades tão díspares e dá-lhe Papuas selvagens, Parses incréus e Indianos ferozes.
Devemos sempre lembrar que Verne, escrevia para adultos, era muito popular, e passava já naquela época por possuidor de muita criatividade. A melhor forma de prever o futuro é inventá-lo, então, resguardava-se, pois de críticas, narrando como crível, a Indiana sequestrada possuir “pele alvíssima” (pág. 74) e em não citar os problemas Ingleses e na época, Americanos, com os Chineses e o Ópio, trenós movidos a velas etc.

Ideais cavalheirescos, nobres decisões, riscos de perda por altruísmo, imagens vívidas que fazem de Fogg um “Nobre” da velha estirpe; aquele que ainda não vislumbrou o movimento de massas a se formarem. Ele é o aventureiro, Passepartout o carregador de malas. Fogg e suas múltiplas facetas encena o homem moderno da era Vitoriana, enquanto Passepartout, a um alter ego do simplório, homem comum, capaz já de decidir seu destino, mesmo de por vezes, ter de ser tutelado.

Os Países de “raça branca” estavam seguros de sua supremacia sobre povos não brancos da Terra. A inferioridade e passividade dos povos coloniais eram consideradas quase naturais. O que duraria até 1910 Com a Revolução Chinesa.

 Mas aí, é outra história.

*BIBLIOTECA JÚLIO VERNE – Título original: Le tour Du monde em 80jours.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Medo

Medo. O terrível e algumas vezes risível medo.  Por sentir medo, criamos Deuses, matamos, morremos, entregamo-nos ao impensável.
Atravessamos agora a mais um dos testes, que a todo o ser humano  é dado viver, decidir e aprender, por que não?
A greve de policiais da Bahia obrigou-nos a vivenciar o que seria comum a qualquer classe profissional do mundo, o justo reclamo de melhores salários.
O que pode não assustar, mas surpreender, é a facilidade com que pessoas abordam a possibilidade de tal greve chegar ao Rio, por meio das redes sociais, fazendo coro, a maneira desses  negociadores criarem o medo.
Observem a história. O Rio, nunca dependeu do poder público para suas festas, antes, sempre o excretou para fora de suas áreas de atuação.
Alardeando suas bravatas, depois do que nos foi dado conhecer hoje pelos jornais, entende-se que há pessoas que conclamam não ao povo para defender suas reivindicações, mas aos bandidos ocultos em suas locandas, para ajudá-los, fomentando o medo diverso. Qual a novidade disso?
O povo tem que ser capaz de defender-se sozinho. Ao povo cabe a hombridade de saber-se livre, e capaz de defender a essa liberdade.
As pessoas assustadas tremem na Internet, pelo medo de seu carnaval perdido. Tecem comentários acerca de bandidos, descendo morros com AR15 nas mãos, e daí? O Rio é do povo. O morro é do povo. Quem experimentou a liberdade, brigará para não perdê-la.
Somente a nós, cabe esse desafio. Enfrentamos o medo, agora que sabemos que ele está sendo orquestrado, vamos à rua, sambemos.
Os modernos constroem em solo baixo, mais sólido, não o do medo, mas o do que amparará o futuro. De nada servem mensagens em tempo real, falas e imagens instantâneas, se não sabemos evitar o medo. “As leis são sebes feitas não para deter aos viajantes, mas para conservá-los no caminho”. Não saiamos do nosso.
A verdadeira fonte da incerteza está na intenção dos outros, sabemos delas agora, não tenhamos medo.

domingo, 15 de janeiro de 2012

Saudades!!


        

         Caramba! É tão rápida, tão fugaz. Escorre pelos dedos, e eu já sabia.
         Traz então ó vento, aquelas canções todas, todos os músicos e suas sarabandas. Todos os blues, rocks, tangos e boleros. Todos os gemidos. Traz então, devolve ó vida, o que perdemos, acreditando em ti.
         Ao menos sei que tu soubeste aproveitar a comida mais gostosa, o sumo mais apetitoso. Experimentaste a todos os acepipes, iguarias vãs, mas não menos reais que a vida. E o que é na verdade um bom prato? Será menos que um retrato de nossa cultura, nossa fugidia humanidade?
         Profundo conhecedor dos segredos recônditos de um bom vinho, da espumante cerveja, do acerto do alho, do sal e do alecrim, mesmo sem nada entender de caçarolas.
         A profundidade da vida é medida, por nossas descobertas e realizações. O que construímos com nossas visões, realidade, sonhos e adivinhações.  Mesmo sabendo de antemão que todos iremos... não aceitamos essa sina. É! Vivemos sem a vida aproveitar, ao contrário do que você fez.
         Ah, Carlos! Quanto faltou dizer, mostrar, conversar, aprender com você. Como planejei ao que não ocorreu, veja só que desperdício!
         Lembra da conversa, sobre a arte, que tivemos em sua casa? Das diferenças  gigantescas entre o nosso tempo  e o que se avizinha agora? Pois é... Saudades.
         Você o colecionador. O que amealhou fagulhas de cultura dispersas hoje, como banais informações, importantes como nunca o foram, e poucos as conseguem compreender agora. Você sabia.
         Saudades de você!
         E a obra principal, seus filhos? A arte exposta, a que cumprimos visando nossa marca em um futuro qualquer, essa você também cumpriu. Seu trabalho foi cumprido integralmente, pois partiste antes deles, e isso é o que a vida preconiza como correto.
                   Mas lembra, de que teu filho num arroubo de clarividência intuiu a necessidade de uma despedida. E lá fomos nós para um churrasco alegre, a cerveja gelada, os dois teus e a minha, os filhos satélites. Filhas e filhos, nossa raiz, chama, vida! Provada agora com o que sabemos das descobertas de nossos genes, a raiz do que deixamos às gerações futuras é muito real. Multiplicamo-nos, e você estará sempre aqui.       
Foto: R.Ferrari

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Flash


Olá! Somos nós.
Estamos ainda aqui, assim, assim...
Melodramático instante pensamos.
Porque pensamos sermos um, e somos milhões
Vemo-nos como a raspa do tacho, o escuro da criação.
Somos apenas achas, na fogueira das vaidades.
Somos a raça humana
A única casta animal que ri, chora e sabe que vai morrer.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

O Samba é Assim...


    
             
               
                Os hindus, em sua mitologia particular, consideravam a música, como uma força, um poder, extra-homem e natural. Uma força de e da vida. Viam o fruir da vida como possuindo dois aspectos: o bom e o voluptuosamente agradável, e diferenciavam os dois como escolha de sábios e tolos.
                A dualidade deste tipo de pensamento: bom e mau, certo e errado, esquerda e direita, Yin e yang, nos perapssa até hoje.. Criam os hindus, que aos sábios, o bom, seria a escolha acertada, visto as empulhações a que nossos sentidos nos expõem e são expostos, levando-nos a erradas definições, enquanto a simplicidade do agradável deixar-nos-iam entregues a facilidades de escolha do que é aceito, sem julgamento ou embate mental. Perfeito.
                Em resposta a árias e marchas a que nossos antepassados estavam expostos, criamos a mais formidável máquina de ritmos.
                No Brasil, seguindo o exemplo do planeta, que descobria gosto pela música negra, coronária, rítmica, o samba apareceu. Invenção de malandros, umbandistas, negros e capoeiras de escol, quando as agremiações carnavalescas, desfilavam ao som de polcas, árias, marchas e mazurcas.
                Sem acesso a variedade de instrumentos de seus irmãos do norte, os negros da América sulina aperfeiçoaram as batidas e utilizaram o violão. E jazz! Não, Zaz! “Isso aqui IOIÔ, é um pouquinho de Brasil...”
                Os negros saem de seus folguedos marginais, no sentido de periféricos, para o centro da roda da arte. São eles agora que ditam o ritmo. E esse é sincopado, malemolente, swingado, e sempre, sempre participativo. O sentimento toma outra vez partido. Partido alto.
                Ao final do império de Pedro, o segundo e último, Momo migra de Deus a Rei! Claro! De Deus menor de uma cultura bolorenta, a Rei de um novo País, promoção! Pois não?  E seus súditos se contorcem, sacolejam e trepidam. Alegria, ainda que tardia, ainda que só por aqueles dias. Os quatro da fuzarca, aos poucos das cantigas.
                Morrem lentamente personagens que se criam eternos. Os Dominós, os diabos, os Velhos os Zé pereiras. Morrem em figura, mas permanecem nos fiapos da memória. Permanecem na ativa. Disfarçados ou transmutados, açambarcados e fremidos, alguns emergem em outras figuras. Os Velhos, nos passos do dito samba, os Zé pereiras no agora redobrado e infinito bumbo, e seus primos, atabaques, pandeiros e taróis.
                Pindorama rediviva em arte e criação respira aliviada. A arte musical seguiu seu passo, contrapasso, anseio. Um povo, vários povos, negros, mesclados açambarcados, reclinam-se sobre toda uma cultura perdida, e recriam ao seu modo, com o estofo do novo mundo, uma nova e exuberante cultura, donde o samba emerge, supremo, altaneiro, talvez a maior arte musical, criada na América.

sábado, 19 de março de 2011

Carnaval da Europa ao Rio


                “Rio 40 graus – Cidade Maravilha Purgatório da Beleza e do Caos”
                Ah! Tempos que passam... Que somam um Deus a Deuses, em uma dicotomia de mensagens, imagens, formas do sentir. Não narrarei, sobre o grande Dionísio, mais que o necessário. Sua sombra velada nos perpassa, mas isso não é, e não será tudo. Por acréscimo Dionísio (Baco) migrou do deus da embriaguez para o Deus da inspiração. Na antiguidade nunca houve ou ocorreram celebrações iguais, nas regiões onde se celebrava o culto a um Deus. 
 A Dionísio, duas formas de adoração soavam peculiares:
1) 0 caráter orgíaco;
2) A presença de mulheres.
                No início da primavera realizava-se a festa Antesteriass, o festival do vinho novo. Fechavam-se as portas das casas e dos templos, lacravam-se as entradas ao sagrado; pois nessa ocasião, as almas dos mortos vagavam pela terra sem perdão. Isso deu origem á outra lenda, mas o que nos interessa no momento, é o carnaval. Sigamos, pois... Ritos campestres, ligados a colheita, as estações, ao tempo, transmutados séculos após séculos.
                Os festejos do carnaval, com todos os atos e ritos cômicos que a ele se ligavam, ocupavam um lugar muito importante na vida do homem medieval. Além dos carnavais propriamente ditos, que eram acompanhados de atos e procissões complicadas que enchiam as praças e as ruas durante dias inteiros, celebravam-se também as festas dos tolos (festa stultorum) e a festa do asno. Existia também, um riso pascal, muito especial e livre, consagrado pela tradição. Além disso, todas as festas religiosas possuíam um aspecto cômico popular e público, consagrado por festas a deuses agrícolas, festas campestres, ritos silvestres. Era o caso das festas do templo, habitualmente acompanhadas de feiras. O mesmo ocorria com festas agrícolas, como a vindima, que se celebrava igualmente nas cidades.
                Entretanto, nas etapas primitivas, dentro de um regime social que não  conhecia ainda nem classes, nem estado, os aspectos sérios e cômicos da divindade, do mundo e do homem eram, segundos todos os indícios, igualmente sagrados e igualmente poderíamos dizer: ”oficiais”. Lembramos, também, que as festividades (qualquer que seja o seu tipo) são uma forma primordial, marcante da civilização humana. Não é preciso explicá-las como produto de condições e finalidades práticas de trabalho coletivo. E aí atravessamos o regime feudal, religioso e comercial, de significações hierárquicas especiais, de compartimentação em estados e corporações.        Ao longo dos séculos de evolução, o carnaval da idade média, preparado pelos séculos de ritos cômicos, velhos milhares de anos, incluindo aí as Saturnais, originou  uma linguagem própria. O caráter utópico, valor de concepção do mundo, desse riso festivo, dirigido contra toda a superioridade social. A burla da divindade. São as celebrações carnavalescas portuguesas e espanholas, tão importantes na vida medieval, que vem dar ao novo mundo da América, essa festa burlesca, caricata, de antigas sapiências e ritos e que será acrescida de uma música criada pelos escravos, trazidos d’lém mar para o trabalho servil, mas só depois. Sigamos então... Ultrapassamos a Inquisição, o erro tácito, tático, social, e mental da Igreja.
                O traço marcante do realismo grotesco é o rebaixamento. Isso é a transferência ao plano material e corporal, o da terra e do corpo na sua indissolúvel unidade, de tudo que é elevado, espiritual e ideal, em abstrato. Degradar, desmascarar, encarar a degeneração. Na realidade a função do grotesco é liberar o homem das formas da necessidade inumano em que se baseiam as idéias dominantes sobre o mundo.
                Torcemos então ao fundeado, “o que está em baixo, é igual ao que se encontra em cima”, comum a crença escolástica e medieval. Transladando, isso é a definição de carnaval. Esqueçam religiões e política, grupos e camarilhas, deusas, deuses e igrejas.
Secularmente, o carnaval, é o anverso, o espelho, da praça, do mercado, da sociedade, da cidade, do mundo. Note a exclusão. Sai o campo, entra a cidade.
                Trazido por portugueses e espanhóis, o carnaval aporta aqui como troça, pilhéria, fuzarca, brincadeiras e folguedo. “Sábios ‘alfacinhas”. Aboletados nas cidades e seus co-irmãos d’e Espanha no campo, burilando, mexendo o cadinho, criando a mais portentosa festa popular do planeta. O “entrudo” se posta senhor absoluto da festa. Famílias inteiras digladiavam-se, janelas contra janelas, casas contra ruas, transeuntes, contra passantes, moleques contra cartolas. E dá-lhe água e seringas, bacias e bolotas, um aguaceiro gigantesco e espaventoso. E logo, logo, no século XVIII e XIX a birra, a esculhambação, incomodam a jornais e porção do povo ricos e medianos , donos de cartolas e polícia, incomodam a uns , mas não a todos. O remoque da brincadeira passa a ser motivo de outra batalha, outros personagens, recém absorvidos por nossa incipiente nação. O carnaval culto e civilizado da Europa, a Itália e suas mascaradas, sua música, sua voluptuosidade velada, familiar, toda uma hipocrisia, vendida aqui, como sinônimo de cultura.
                O povo, o povão, não se deixa enganar com as reclamações vazias. O entrudo e sua aguaceira, dura até o começo do século XX. O carnaval é vida, baseada no princípio do riso. A festa é a propriedade fundamental de todas as formas de ritos e espetáculos cômicos desde a Idade média. O carnaval é a segunda vida do povo.
                No Rio, capital Real, do Império e futura República, as personagens da Europa se apequenam, ou transmutam. Vulgarizam-se, mas sempre se enaltecendo, perdendo sua crueza, alcançando uma ternura doce e branda. Perdem sua densa pantomima teatral, violenta e sexual da praça pública de uma Europa Medieval.
                Arlequim, Pierrô e Colombina adentram ao recinto tropical, cara em riso franco agora. As pilhérias nas ruas, os dominós e diabos, os doutores da mula ruça, os “velhos”, os negros de índios, os Zé Pereira e seus bumbos, os escravos, eles fantasiados de si mesmo. Isso sim a diferença. O que marcará a fronteira da mudança será a mesmice do comum. Os escravos e libertos, naquilo que se denominava de Cucumbis ensaiavam sua participação com seus “enredos” semelhantes em todo o país.
                Um desfile de danças “dramáticas,” apresentadas em português, mas cantadas em línguas ignoradas pelos folcloristas. Cantavam e tocavam em roda, e desfilavam batucando pelas apertadas ruas da cidade. Apresentavam rainhas e reis, vinham com seus atabaques, os que de índio travestiam-se, cocares e penas pelo corpo ostentavam os instrumentos, que se podiam facilmente construir: ganzás, agogôs, xerequês, tamborins, chocalhos, marimbas e adufes. O feiticeiro, portando animais da floresta: cobras, lagartos, pássaros, alguns vivos, outros empalhados, evidenciavam seu poder sobre a natureza. Apareciam como primitivos, infantis, pitorescos e não como uma ameaça da mesma natureza, daquela representada pelos diabinhos, dominós etc. Evidenciando um inaudito respeito, enquanto atacavam a brincadeira imorredoura do entrudo, clamando por um carnaval similar ao Italiano ou depois, europeu, os jornais não comentavam negativamente tais apresentações de negros, citando-as quando muito como pitorescas.

 Bibliografia:
A Cultura popular na Idade Média e Renascimento (no contexto de Rabelais) Ed. Huicitec - 2ª Edição;
Ecos da Folia - Maria Clementina Pereira Cunha - Ed. Companhia das Letras;
No Tempo de Ari Barroso - Sérgio Cabral - Ed. Lumiar;
Os Meus Romanos - Ina Von Binger.